Apresentação

Todas as cores da diversidade

Em sua 17ª edição o Visões Periféricas exibe 56 produções, enfatizando a diversidade de formatos, entre curtas, médias e longas de todas as regiões do país, além de temáticas das lutas indígenas, cultura popular, negritude e universo LGBTQIAP+. Estas produções evocam as quebradas de SP, os morros do Rio, o sertão nordestino, as vielas de BH, as veredas do norte, as paisagens baianas, capixabas, maranhenses, potiguares, num esforço de compartilhar memórias, vivências e percepções dos territórios, buscando compreender melhor o campo do simbólico, a criação e a expansão de um potente cinema feito na e pelas periferias brasileiras.

Paralelo a programação de filmes, a realização da 5ª edição do Visões Lab dá continuidade a um espaço indispensável no Festival para o desenvolvimento de profissionais e projetos que contribuem para ampliar a diversidade de narrativas no mercado audiovisual.

Neste ano o Visões Periféricas chama a atenção para um perfil de produção audiovisual que tem marcado cada vez mais presença entre os inscritos no Festival: obras realizadas por artistas transgênero ou não-binários, seja ocupando postos-chaves por detrás da câmera ou protagonizando temas e personagens em documentários e ficções. Esse fenômeno parece vir na esteira das políticas identitárias que vem marcando nossa cinematografia nos últimos dez anos e trazendo uma saudável diversidade para o audiovisual brasileiro. No entanto, as questões de gênero que esses filmes trazem consigo colocam em xeque a própria noção de identidade, marcador social com pretensões à estabilidade. Ao analisar a dinâmica do racismo nos Estados Unidos, Bell Hooks vai dizer que “a sexualidade sempre forneceu metáforas de gênero para a colonização” e podemos pensar que a própria formação da linguagem cinematográfica que se tornou hegemônica em quase todo o mundo foi marcada por narrativas de dominação de um gênero, o masculino, sobre os demais.

Em um momento de nossa história, onde nunca se questionou tanto os estereótipos que distinguem os diferentes gêneros e comportamentos sexuais, o que esses filmes realizados por artistas transgêneros ou que abordam o tema parecem evocar é o potencial inerente à liberdade de produção e circulação de imagens de desestabilizar narrativas, de provocar rupturas, de confundir. São filmes que propõem outras formas da sociedade lidar com o corpo, com o prazer, com a imagem; outros mundos possíveis.

É por isso que nesta edição escolhemos homenagear Linn da Quebrada, artista que representa esse movimento sentido com força pelo festival. Transitando com desenvoltura por diferentes expressões artísticas – a música, a performance, o audiovisual –  nesta última, Linn encontra uma linguagem disposta a abraçar todos os seus anseios criativos. Linn tem se destacado em inúmeras produções no cinema e na televisão, trazendo com ela não somente questões ligadas ao gênero, mas também sua origem periférica e racial. Mostramos um pouco dessa produção na Mostra homenagem e estamos felizes de poder abrir a 17ª edição do Visões com um filme inédito dirigido por Linn que fala dela e seu processo criativo, mas também fala por todos nós que desejamos um mundo mais inclusivo, colorido,  onde a diferença seja constante fonte de aprendizagem, tolerância e criação.

Marcio Blanco
Coordenador geral do Festival Visões Periféricas